sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Carta da Sociedade Brasileira Hepatologia ao MS

Bem que o governo federal tentou, chegaram até a mandar uma carta pronta, so faltava a assinatura da Sociedade Brasileira de Hepatologia... Todo este esquema foi montado para fazer o que fizeram com o tratamento de câncer, tirar um medicamento necessário para o tratamento das hepatites virais. Com a alegação de que eram medicamentos iguais, tentaram tirar do médico a dignidade de praticar o “Ato Médico”, ou seja, receitar para o paciente o remédio que acha que deve receitar. Vejam abaixo a carta do Dr Raimundo Paraná ao MS.

Prezado Dr. Ronaldo.

Conforme anteriormente conversado, exponho a posição dos Membros da Diretoria da SBH que responderam acerca da compra preferencial para um dos Interferons Peguilados em processo licitatório.

Rogo a V.Sa. que tenha uma visão mais ampla e contextualizada das manifestações dos colegas sobre o assunto. Estamos num período particularmente de expectativas na Hepatologia Brasileira pela vinda dos novos inibidores de protease cujos estudos de Fase III mostraram espetacular avanço no quesito “Cura de Hepatite C em Pacientes Difíceis de Tratar” como aqueles portadores do genótipo I.

Os Centros de Referência em Hepatologia no Brasil estão absolutamente pletóricos devido aos pacientes portadores do vírus da Hepatite C, mormente aqueles que não responderam a terapêutica Standard (Interferon Peguilado e Ribavirina). Estes pacientes abarrotam os nossos ambulatórios criando obstáculos para a entrada de novos pacientes. Assim, esses medicamentos são esperados com muita ansiedade. Por isso, qualquer situação que possa dificultar sua incorporação nas nossas políticas publicas de tratamento de alto custo nas diretrizes terapêuticas criará resistência.

Alem disso, tivemos recentemente a desastrada política de obstaculização das diretrizes terapêuticas para Hepatite B. Os responsáveis por esta política não tem a menor idéia da dimensão dos problemas que criaram para o Sistema Único de Saúde do Brasil. Infelizmente, não se dão conta do seu desserviço para com a população brasileira e, sobretudo, o descrédito que semearam nos hepatologistas deste país.

Só recentemente, este assunto foi resgatado através de uma atuação estratégica da Dra. Mariangela juntamente com a sua equipe, incluso o seu importante papel.

Ademais, os hepatologistas brasileiros estão ansiosos para que tenhamos uma política publica de saúde voltada a Hepatite C no Brasil. Isso passa muito além da terapêutica da doença, uma vez que sabemos que ao longo deste tempo, embora tenhamos melhorado na assistência terapêutica, continuamos com a desconfortável situação de diagnosticar poucos casos novos quando sabemos que no Brasil existem milhões de pacientes infectados.

Temos ainda o desconforto de uma política desigual entre a AIDS e as Hepatites Virais. Este aspecto aos poucos tem sido corrigido e esperamos que seja celeremente corrigido com a incorporação do PNHV ao Programa DST/AIDS, todavia a despeito da evolução, ainda temos um imenso hiato.

Permeia também entre os membros da Sociedade Brasileira de Hepatologia o receio da retirada da linha virológica da Indústria Farmacêutica que perder a licitação. Não pode ser desconhecido de que a Indústria Farmacêutica tem hoje importante atuação nos Programas de Educação Médica Continuada das Sociedades e Especialidades, até porque o espaço encontra-se vazio, visto que o Estado não o preenche.

Assim, há nítido receio sobre consideráveis perdas nos importantes programas de educação medica que tanto tem contribuído para a ampliação da assistência aos portadores de doenças hepáticas no SUS.

Dentro deste contexto, a imensa maioria dos Membros da Diretoria da SBH, considerara inoportuna esta discussão. Obviamente que, sendo uma política pública de saúde, terá de ser amplamente discutida sem cegas resistências ou preconceitos, todavia gostaríamos de obter mais detalhamento das informações acerca da utilização da economia de recursos no aumento do escopo de assistência aos portadores de Hepatites Virais no País, mormente na assistência básica.

Urge a necessidade de termos disponibilizados no País um teste rápido para diagnóstico do HCV nos nossos programas de saúde da família. Também nos Postos e Centros de Saúde dos Governos Estaduais. Acreditamos que sem estes recursos pouco poderemos oferecer na questão da ampliação do diagnóstico desta doença. Assim continuaremos com as tristes estatísticas que colocam a Hepatite C como responsável por mais de 50% dos nossos transplantes hepáticos, contrastando com a mudança significativa que já se observa nos países mais desenvolvidos, onde as ações de combate a Hepatite C são implementadas de forma eficaz.

Dentre os principais pontos destacados pela nossa Diretoria encontram-se:

1- Necessidade de negociar com as Indústrias Farmacêuticas no intuito de reduzir o preço do medicamento. Todos sabemos que o Interferon Peguilado tem os seus dias contados na terapêutica das Hepatites Virais. A indústria farmacêutica sabe que a partir de 2015 deveremos considerar o tratamento sem Interferon Peguilado, uma vez que os inibidores de protease de segunda geração e os inibidores de polimerase deverão ter ganhos de segurança e eficácia dispensando o uso do Interferon Peguilado. Desta forma, alguns membros da SBH acreditam que a negociação com as ambas indústrias farmacêuticas fornecedoras de Interferon Peguilado devam ser levadas a fundo nesta discussão.

2- O Brasil prepara-se para fazer estudos de não-inferioridade com a sua formulação de Interferon Peguilado de Bio-Manguinhos. Portanto, talvez não seja este o momento mais oportuno de implantar a política de aquisição majoritária de uma única formulação.

3- Os Interferons Peguilados foram testados com diferentes inibidores de protease nos seus países de origem. É possível que os inibidores de proteases sejam registrados com diferentes formulações de Interferon Peguilado e isso poderá trazer dificuldades para incorporação desses novos medicamentos nas nossas diretrizes terapêuticas ministeriais. Este aspecto causa especial preocupação junto aos hepatologistas, até porque vivemos recentemente a desconfortável situação criada pela não incorporação dos novos medicamentos para o tratamento da Hepatite B por mais de 10 anos.

4- Existem colegas que defendem a discreta superioridade de um Interferon Peguilado sobre o outro numa população especial de pacientes obesos, com alta carga viral, genótipo I. Este aspecto baseia-se em algumas publicações que mostraram a existência desta discreta diferença. Embora os expertos da Sociedade Brasileira de Hepatologia tenham votado pela inexistência de grandes diferenças entre as duas formulações, individualmente uma delas pode ser preferida neste sub-grupo de pacientes, segundo manifestação de alguns.

5- Trata-se de uma medicação de uso supervisionado. Por conta disso, em virtude de arranjos em alguns Estados, existem colegas que só tem experiência com uma das medicações.

6- Por ser um medicamento de uso supervisionado e registrado na ANVISA como restrito aos hospitais, o Interferon Peguilado tem a obrigatoriedade de cobertura da saúde suplementar segundo a Lei 8656/98.
Por conta disso, alguns membros da SBH consideram que o apoio do Ministério para que tenhamos no Brasil a incorporação do Interferon Peguilado na cobertura da saúde suplementar teria uma economia muito maior do que esta que se pretende com a compra preferencial de um dos medicamentos. Infelizmente, apesar de alguns membros da Sociedade Brasileira de Hepatologia se manifestarem sucessivamente acerca deste desproposito que só acontece no Brasil, o Ministério da Saúde nunca implementou uma ação especifica de apoio para que o Ministério Público Federal obrigue os Planos de Seguro de Saúde na cobertura deste medicamento.

Se incorporada na saúde suplementar, conforme reza a lei, temos estudos que nos apontam a possibilidade de retirada da rede de mais de 50% dos pacientes que estão em tratamento, uma vez que, no nosso sistema elitizado de assistência farmacêutica de alto custo, boa parte dos pacientes que buscam os medicamentos no SUS são oriundos de consultórios privados. Portanto, se fizéssemos cumprir a Lei 8656/98 teríamos uma estrondosa economia que poderia se reverter para resolvermos os nossos crônicos problemas de dificuldade de diagnostico e introdução da rede da imensa maioria dos portadores de Hepatite C no País.
Diante do exposto, a SBH mantém a sua proposta de estreita cooperação com o Ministério da Saúde para manter aquilo que considera o maior patrimônio social do País: o SUS.

Atenciosamente.

Raymundo Paraná
Presidente da SBH





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